20.12.10

baby, think ya used enough dynamite there?


'boy, I got vision, and the rest of the world wears bifocals....'


Butch Cassidy, personagem vivido por Paul Newman 
(os olhos azuis mais amados da minha mamãe)



Uma das minhas atividades favoritas é ficar quieta. Prestar atenção no que geralmente não recebe nada da mesma, regular em mim o desejo de se desejar: um tormento, para aqueles que me conhecem. Mas sim, gosto de fazer com que isso seja rotina mesmo que a rotina em si não permita; o truque é manter o truque vivo.

Seguindo...

Numa 'conversa' entre Martin Scorsese e um bando de louco (eu tava la) ao vivo num teatro das antigas aqui em Hollywood (eu moro na área, para aqueles que não sabem que eu não to mais em Gotham), alguém o perguntou sobre como ele se sentia em fazer 'filmes de época', e é claro que o Mr. Director respondeu qualquer coisa de estonteante sobre tais películas (você não ama o som de um Argentino falando essa palavra com gosto?). O que ele disse?Com aquele olhar de nerd debaixo de óculos maiores do que a própria cara, Marty sorriu nervoso e disse 'não existe isso, filme de época? o tempo é agora, o ontem é o que vivemos hoje, o que viveremos amanhã, nunca vi um filme sob esse ponto de vista, a época não vai necessariamente fazer da história algo mais ou menos importante pros tempos atuais' e seguiu com o seu discurso tímido mas no ponto: o tempo é agora.

Hoje, enquanto ficava quieta como é de costume, pensei nisso. O rabisco de chuva lá fora que já dura três dias, coisa atípica em Los Angeles, manteve o ar do aqui de dentro ainda mais acolhedor e na TV (monitor grandão extra ligado no meu notebook, não tenho televisão) passava um filme 'velho' mostrando imagens de certos rapazes lindos e familiares, deixando algumas frases tão comuns reverberar na minha caixola enquanto o pouco do que fazia sentido se mantinha adormecido...

Um daqueles rapazes já morreu: Paul Newman. O outro continua vivo e enrugado, cheio de projetos que geralmente são recebidos com alguma resistência e narizes tortos por meia indústria (Hollywood) ou são aplaudidos com louvor pela outra metade. Eu nunca fui muito com a cara do segundo mas ando mudando de opinião. Antes ele representava coisas chatas e sem criatividade, hoje já vejo tudo o que ele faz com outros olhos. Já com o Paul Newman as coisas sempre foram diferentes, sempre amei my cool Luke e seu sorriso gostosão e olhar que sempre derreteram o coração da minha santa mãe, a Lucinha... 


A questão é que, tudo o que se passava na história diante de mim, o conteúdo do olhar de um, a carga emocional na voz do outro, as palavras e cenas repetidas sem cansaço pelo projetor (gosto da palavra, não que eu tenha um 'projetor' sobrando) me lembraram que nada, absolutamente nada mudou e que o tio Scorsese tinha plena razão, o tempo é agora.

O filme, feito em 1969 mostra uma época completamente diferente da minha - também diferente da época em que o filme foi feito, já que a história se passa no começo do século 19 - com valores e formalidades que hoje não existem, com uma tecnologia boçal e proto-histórica mas com qualidades humanas imutáveis. Com detalhes que talvez não se repitam na história com as mesmas personagens mas com outros... que vão sempre manter a qualidade bruta que tanto amo em nós, membros dessa raça imbecil: a resistência contra tudo aquilo que não é realmente simples que no fim sempre ganha.

Ou será que eu claramente sou cheia de esperança estúpida demais? 

Quem sabe... 'it's a small price to pay for beauty' he says.




***


17.12.10

o agora.


---porque a gente lava a louça ouvindo Chico e presta atenção na chuva lá fora com a Elis. as memórias tão vivas como filme fresco rodando num projetor na parede branca do prédio do outro lado da rua, a mãe que tinha mãos tão fortes e precisas como as minhas que por algum truque da vida aprenderam a se cortar constantemente. o cheiro... o cheiro de café, canela, sabão e forno aceso tudojunto, tudopronto. o pão, o verde e as ervas sobre o queijo... o azeite. o beijo molhado que não se espera, o aperto no peito...

e o meu amor que não vem.

***

20.11.10

amor só é amor quando...



'love ain't love until you give it up'
eddie vedder





Ah... Eu conheço bem o cheiro, a mistura de cigarro queimando e um leve odor de algum tipo de bebida alcoólica (geralmente vinho tinto chileno), o peso da lã fina usada na confecção da flanela que deve ser a de estimação, afinal ele sempre é visto com ela... o pisar firme das botas sujas de lama, remendadas, reutilizadas, reabilitadas over and over and over again... sim, eu conheço bem. O cabelo emaranhado, tão parecido com o meu. Eu conheço bem.

Quantas vezes repeti que o que me bastava na vida era um Eddie Vedder e uma janela pra chamar de minha? Milhões. Quantas vezes conquistei toda essa simplicidade que preciso? Nenhuma. Quantas vezes decorei alguma música que de cara se enfiava na minha intimidade de tal maneira que a dor não passava de lembrança esquecível? Quantas vezes a melodia, a letra e tudo aquilo que vive e respira nas entrelinhas, revirava com um mundo que ainda não conhecia, pronto para me engolir?

Muitas. Milhares. Tantas que não sei se existe número que conte.

Paro e penso se devo dizer o que vou dizer... mas digo mesmo assim, sempre estive pronta. Todas as vezes, por todo esse tempo, do começo ao fim e do fim até o próximo começo... 

Não que eu espere que de fato esse cara vá caminhar até minha porta, dar um hello e me chamar pra dançar na chuva, mas que o tempo que a música dura, os instantes logo após os primeiros acordes, os segundos entre uma palavra e outra - o tempo de uma inspiração ofegante ou não - são no fim tudo o que preciso. Os segundos necessários para que um sonho qualquer ou uma visão, revitalizem todo um corpo e mente de uma menina pouco sã, feliz demais por amar desse jeito único dela.


Até a próxima canção.




***

16.11.10

vinte e seis, dezoito, dezesseis anos... é tudo a mesma coisa.


Eu? Eu gosto de livros na estante, de cores infinitamente mais delicadas do que as minhas cores naturais por todos os cantos, da música alta chorando baixo entre quatro paredes e prefiro os perfumes úteis. Sim, é o que você ouviu. 

Pois no dia treze de novembro de dois mil e dez fiz vinte e seis anos, se isso ainda importa? Não sei. Desde quando completei dezoito anos parei de perceber... aliás, tudo mudou quando fiz dezesseis e por ali parou. Acabei sempre sendo uma continuação das mudanças que propus para mim mesma naquele ano e a partir dali, a vida surgiu de maneiras (quase) óbvias e ao mesmo tempo tomou rumos indistintos. O centro, o miolo, a raiz continuam as mesmas... por sinal: a mesma. Uma cumplicidade do mesmo inteira, cheia de ramos que unidos engrossam, encontram força e buscam pela superfície... do que? De mim mesma.

O desejo, o intuito, a razão sempre foram um. O resultado, o fim do túnel, o pote de ouro no final do arco-íris sempre teve um nome e o nome sempre foi o mesmo, nunca mudou a cor, o jeito, o cheiro como o tempo insiste em querer que eu acredite... o tempo não mudou desde os meus dezesseis anos, os olhos observando num canto da minha janela, as mãos prontas para me apoiarem assim que a queda fosse iminente... ah, dez anos se passaram e por mais que tenham passado, os meus dezesseis anos vivem confortáveis dentro das minhas veias...

Meus dias nunca mudaram apesar de terem mudado radicalmente. Meus prazeres, minhas vontades, minha beleza que toma formas diferentes, sempre, continuam as mesmas e a geografia por mais que grite 'alice doesn't live here anymore!' está brutalmente enganada. Sempre vivi onde vivo, desde os meus dezesseis anos...

Pois, vinte e seis. Vinte e seis em um treze de novembro de dois mil e dez é algo para ser marcado, não porque qualquer coisa tenha mudado.... mas precisamente porque nada, nada realmente mudou - e isso é bom.



***



23.10.10

je te raconterai l'histoire de ce roi...


***


Jacques Romain Georges Brel era um garoto franzino com mãos grandes e orelhas maiores ainda. Sua capacidade de demonstrar qualquer tipo de dor enquanto homem diante de um microfone era tão grande, que a mera menção de seu nome causava desconforto entre os ianques reis do palco... 

Sua voz nunca se fez popular no mundo azul e vermelho da América deles, mas se fez popular o bastante na sala de estar de outra América, uma mais verde e amarela, uma mais simples que a deles. Ne me quitte pas, ne me quitte pas... implorava o rapaz das orelhas grandes num sistema de som adquirido no Texas, Estados Unidos da América no apartamento da mamãe sobre uma farmácia qualquer da grande capital do Estado de São Paulo... ne me quitte pas... moi je te t'offrirai des perles de pluie venues de pays où il ne pleut pas...

Mamãe cantava junto com olhos distantes e emocionados.

Ele tinha meu coraçao apertado entre os seus dedos grosseiros bem antes, enquanto pronunciava 'le coeur du bonheur'...


***

6.10.10

'The Town', Ben Affleck, Rebecca Hall e o amor disso tudo


'it's gonna be like one of my sunny days...'
claire no filme 'the town'


Fazia um bom tempo que eu não conversava com vocês a respeito de absolutamente nada tangível, muito menos a respeito de um filme (nada tangível também, por sinal). Pois hoje eu preciso. É praticamente uma questão de honra mas muito além da honra, é uma questão de respeito. Respeito por aqueles que eu tive a paciência e a sensibilidade de ver sob outra luz, uma luz um pouco mais aguda do que uso continuamente. Pelo menos hoje, pelo menos nos últimos tempos, eu tenho deixado certas portas (e janelas) absolutamente escancaradas. 

Pois, vamos nessa. 

Ben Affleck foi sempre carinhosamente (talvez nem tanto) chamado de Bunda Affleck por moi. Seu grande pecado? Ter namorado a bem grande bunda 'en route' e errada da Jennifer Lopez. O problema com isso? Todos. Quem pode em sã consciência pensar que fazer parte da febre popular norte-americana conhecida como 'Bennifer' vai fazer com que sua imagem ganhe qualquer coisa parecida com integridade? Só um louco pra pensar isso... Só um louco pra não se importar... Só um louco pra reconhecer o outro...

Enfim. 'The Town' é um filme dirigido por Ben Affleck, estrelado por Ben Affleck, roteiro de Peter Craig, Aaron Stockard e... Ben Affleck (!) baseado no livro 'The Prince of Thieves' de Chuck Hogan. A história é conhecida para aqueles que sacam que a maior população Irlandesa fora da Irlanda está em Boston, Massachusetts nos Estados Unidos e errados da América. Como tudo de certo do mundo está caído moribundo e quase respirando em alguma parte da terra do Tio Sam, com essa história não poderia ser diferente...

Um rapaz (Ben Affleck a.k.a. Bunda-Man-Que-Tem-A-Cara-Do-Meu-Pai) todo machucado por um passado no mínimo brutal, com um corpão tipo 'papai-esqueci-de-ler-mas-lembrei-de-carregar-esses-sacos-de-pedra-pra-pagar-as-contas-do-mês' cheios de olhares doloridos para cima dos seus amigos que infelizmente são mais cheios de testosterona do que de qualquer massa cinzenta entre as orelhas (Jeremy Renner, Owen Burke, Slaine) acaba se apaixonando por quem não deve: a moça gerente do banco que ele acabou de roubar (Rebecca Hall, a mulher da tela de prata que é como mulher de verdade é). Também pudera. Ela não é só linda (e não é mais 'linda' tipicamente falando do que a vaca loira que dá em cima do nosso herói o filme todo interpretada pela super-duper popular Blake Lively), ela é também... simplesmente simples. Porque não existe coisa mais linda do que notar que alguém é excessivamente real, tão real que deixa a ferida à mostra...

Rebecca Hall e Ben Affleck

Eles se apaixonam o suficiente para que todo o resto pareça inútil mesmo sem nada disso ficar óbvio... sim, caros amigos, viver vale a pena quando amar é o seu único objetivo. O problema no entanto, fica mais embaixo... Ele precisa enfrentar muitos obstáculos: a máfia irlandesa de Boston (leia com sotaque), o FBI e o fato de que a linda da moça não sabe a verdade a respeito do seu grande amado...

O que fazer?

O que fazer é simples, veja o filme. Ou leia o livro. No Brasil-de-meu-Deus, eu não sei como o chamam, acho que ainda não tem em Português de qualquer forma... então esperem o filme e vejam porque, no fim das contas, um cara que era conhecido como a piada bunda de um PAÍS virou um cara grandalhão, com uma mente feita de mercúrio, preparada para se adaptar o suficiente, preparada para não ser mais nada do que a voz simples de um amor maior do que a vida e uma verdade ainda maior do que isso.

Afinal de contas, certas vezes tudo o que precisamos é ir à beira do ridículo da popularidade para que a voz seja entregue a quem nunca conseguiu se expressar porque nunca soube como.


Poster original do filme


***


1.10.10

meu pai, paixão e jung - primeira parte


Freud / Jung


Como vocês sabem - talvez não saibam de nada - meu pai era psiquiatra. Tinha um orgulho tamanho disso, mas orgulho maior era sua admiração pelas visões de Sigmund Freud, como se tudo aquilo pregado por ele fosse de fato tudo aquilo que ele precisava saber.

Algumas das minhas primeiras memórias estão relacionadas ao grande quadro de Freud que papai tinha pregado na parede do seu escritório. Quando nos mudamos para o apartamento e após a morte do meu pai, o quadro foi parar no meu quarto... inexplicável mas não absurda a ideia de se ter aquilo que meu pai conhecia como sua explicação maior e mais completa de vida, observando tudo aquilo que fazia quando ali estava. Meu quarto, os olhos atentos de Freud. Meu pai.

Até uma noite em que misteriosamente, o quadro... caiu.

O espanto foi enorme, mas a rapidez com que levantei-me da cama foi quase esclarecedora. O quadro parecia gritar para que eu acordasse, acordasse e deixasse qualquer coisa de lado... ou não?

Meu pai detestava Jung. Não. Vamos ser justos, ele não ia com a cara de ninguém que tivesse qualquer idéia conflitante. Como bom Affonso, apaixonado por qualquer coisa que seja, sua paixão pela clareza quase matemática e bruta a respeito dos tormentos humanos de Freud o mantinha distante de qualquer outra razão ou possibilidade. Afinal de contas, ele já era um senhor cheio de manias e pensamentos cristalizados quando eu, pré-adolescente e obstinada disse 'mas papai, ouvi falar de Jung e de seu conceito de memória coletiva... gostei'. Foi quase um insulto, um tapa na cara.

Como sua filha, a filha mais preciosa, a mais única e a mais querida poderia de fato gostar de... Carl Jung?

A reação foi categórica, ele agarrou qualquer coisa numa gaveta, buscou seus óculos de leitura e fez qualquer sinal para que eu o deixasse quieto. Bingo. Jung era o nome daquilo que o irritava e Jung era exatamente o eu buscava...


TO BE CONTINUED....

27.9.10

sobre o calor



- Cansada. Seus lábios pesavam irreverentemente, a pele transpirava como se a dor de se carregar todo o desejo do mundo não fosse incrível o suficiente. Como se tudo o que se deseja não fosse nunca o suficiente.

Ele notava o coração palpitante no pescoço, a pele ainda eriçada. Percebia a respiração aparentemente calma que com angústia revertia o pequeno nariz dispendioso em templo temporário. Gostava do olhar pesado que ela sempre teve, um peso de tudo aquilo que encharca sem deixar derramar.

Ela não deixaria derramar, não para qualquer um.

Duas pernas de fora e um calor de se rasgar a roupa por alívio. Suas duas pernas que andariam o que fosse por ele. Ela de fato nunca admitiria... duas pernas prontas para largar tudo por ele e pelo suor do seu corpo. Ela, toda pronta para confundir-se com a química do suor dele...

As mãos nervosamente procuram pela página perdida no devaneio.

(Sonhar tão grande e grave deveria ser coisa para algum quarto escuro...) -



23.9.10


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fotos novas... aqui.


21.9.10

delirar é


-- gosto do toque dos dedos contra o vidro da taça que é liso, que me lembra de tudo aquilo que desliza, de tudo aquilo que manipula o espaço para que a forma seja o único conteúdo que prenda um corpo... ao outro. --



12.9.10

escrevi não faz tanto tempo...



-A Página Em Branco. Escrevo Assim Porque Assim Enche Mais O Branco. o assim que sem ter muito a ver com o branco o preenche. EntendE? Com a mesma violência com que Jamie toca qualquer coisa que toca, o meio fio fica a mercê de qualquer coisa que seja. Eu estou a espera, qualquer coisa em primeiro lugar, em segundo vem eu. Terceiro é quem vem em primeiro, e o grande e imenso véu que cobre os olhares secos também esperam por água, ÁGUA, gritam, esperneiam. A areia cobre até os mais miseráveis dos milionários. Todos comem da mesma terra. Todos Comem Da Mesma Terra. Assim encho mais o branco que já não é mais tão branCO assIM. Pois a mulher que me é vive quieta no retrato. Ela está a espreita de qualquer coisa e eu aceito. Aceito alegre pois feliz seria impossível de se aceitar qualquer coisa. Teimo em sair enquanto a neve cai e cobre quase tudo descoberta, é a verdadeira descoberta do ser pequeno. Do ser indiferente. Eu sou indiferente a mim mesma e no entanto ainda prezo pela minha frequente vontade de me criar, criar? Me criar mais. Me regar até que as raízes possam facilmente criar mais e mais filhas até que alguém desprovido de intento arranque-as da onde for que tenham mantido moradia. Assim fico feliz. A música tocA. Toca oca e toca redonda. Porque todo oco é redondo? Minto. Você mente. O oco não é redondO. É ocO. É o osso dentro de um tal osso que responde ao chamarem pelo nome oco. Alguém arrancou meu sorriso, pregou na parede seca, tão seca quanto a minha garganta oca. Nessa parede não existem palavras que expressem a falta do meu sorriso na área mais frágil do meu corpo, é oco. O tal do osso... ele ressona íntimo, quase meu e aceito, alegre porque feliz não se aceita viver. Feliz não é, nem nunca foi. Feliz sempre será. O dia não sorri porque quem quer que disse pela primeira vez que ser sol é ser inteiro estava equivocado, as flores não cantam, choram e a noite tão contida e intensa se derrama por si. A Lua É Inteira Como É InteirA A noitE quE A cobrE poR fiM.-



10.9.10

por fim, enfim



enquanto cor e enquanto força, a marca do peso quase leve demais perdia a pureza e o resultado era a fome. a fome para que o gosto não se perdesse por completo. para que as marcas na sua história não fossem tão passageiras quanto as que já se apagavam do corpo.

enquanto tempo, ela não o dominava e nem pedia por mais. 

ela queria menos. 

menos espera nessa sala cinzenta e com cheiro de incerteza que tão bem conhecia.

mas enquanto esperava, rabiscava qualquer coisa num pedaço de papel. seria o rosto dele? ou um nome quase esquecido que ainda vagava pelos seus sonhos diários, um tipo com um ar de problema e recompensa maior do que a espera, mais aguardado e menos impossível de se obter do que a paz mundial, mais relevante ao seu mundo de cubículo em romance clássico do que qualquer outro mundo infantilizado ou estilizado de suas companheiras de sala de espera...

era. era ele por fim.

um nome. ela tinha algum nome escrito num papel, enfim.



***


*foto: aubrey no fígaro, por moi.

2.9.10

o homem da razão





'o que é isso então?' foi a pergunta que estraçalhou todas as incertezas que ele carregava nos ombros naquela tarde fria.

'um nada. para que algo tem que ser qualquer coisa?'

mesmo sem querer ele queria não querer e isso sem dúvida alguma era a dúvida que ela representava. 

a dúvida. porque ela sempre perguntava e respondia com a negação em mente? 

porque era mulher, uma mulher de pele tão feminina que todas as flores da estação revidavam com o mesmo vigor quando ela passava... as cores desavisadas revidavam em tons mais quentes, as dobras e cantos das pétalas se rebuscavam incandescentes num ato de pleno desespero e medo de perder suas posses, as folhas envergonhadas rejeitavam o vento e as árvores... bem, as árvores observavam quietas mais uma rival móvel, enfeitiçante e enfeitiçada como o vento que não fazia mais do que passar e partir... para nunca mais ou para talvez amanhã cedinho.

era mulher. a mulher que era a dúvida.

'e porque tamanha dúvida? por que não acreditar no que não se tem razão?'

'porque de falta de razão quem entende sou eu, e tudo o que eu quero saber de entender agora é de você... razão aparte de mim que quero ter... para mim.'

o vento soprava quase infértil...

'porque o vento é homem da razão..'


***



*imagem Alice & Jo do filme 'dans paris'.









27.8.10


-/-

imagens novas... aqui.

-/-


21.8.10


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texto novo aqui.


***


because the evening i've always longed for...


*** eu. eu que gasto horas da minha noite, do meu dia, do meu sono, do meu sonho com tudo aquilo que me faça chorar.

não, o chorar não é o que me preocupa nesse exato momento, o chorar não é o importante. o sentir é. sentir-se inteiro de alguma forma que seja, mesmo que seja chorando já que todas as outras opções simplesmente se transformaram em leves visões de um mundo além do meu.

tudo o que eu quero, eu quero inteiro, mas deixo passar por inteiro. por amor a liberdade do outro, por amor a uma vida que não seja a minha mas que seja repleta, eu deixo tudo aquilo que amo ir. como se asas fossem tudo aquilo que eu pudesse dar a alguém. a todos.

o teclado. ele é o único que permanece quieto, a espera. a espera é seca e bruta e quase entorpecente, eu a conheço tão bem... e é quando a espera aperta os punhos, retruca em voz mais alta do que a sua e te joga contra o chão que o choro é o único abandono seguro, a única voz que acalma mesmo que silenciosa.

o choro é tudo o que no fim, tenho.

mas então que eu desejo não dar asas a ninguém. não reverter amor inteiro em amor de lembrança, fazer com que o agora se transforme num amor de hoje, amanhã e até que a morte nos separe.

mas a morte vem, e a separação é irreal. a dor é mais real do que tudo. o choro. não que eu saiba do que estou falando afinal saber e acreditar são todas facetas removíveis desse boneco que somos nós. esses bonecos bestiais. bestas. esses pedaços de pano, mal formados que de repente tomaram conta do mundo.

eu quero um tempo. um tempo para me distanciar de tudo o que eu deixei livre pois por deixar livre acabei me agarrando a qualquer coisa que havia sobrado: um pouco do cheiro, uma peça de roupa, uma carta, um beijo.

quero que tudo o que tenha sobrado vire o resplandecer de um por-do-sol contra um oceano azul esverdeado de um sonho bom. quero que o que eu tenha e o que eu seja, seja de fato inteiro e por inteiro como eu, que tudo o que seja, seja meu.

na verdade, é só isso o que eu quero e por querer o que quero sei da grande possibilidade de tudo isso não passar de um projeto bobo, infantil, ingrato... mas não. o querer é o que sou. o querer é o próprio núcleo do que eu sou e por conseqüência tudo o que importa.

(entenda, se a dor não investigar todos os cantos do que sou e não responder por mim, o meu buraco e o meu vazio nunca chegarão ao fim. a luz. eu só quero alguma luz.) ***


20.8.10

can't buy a thrill




"oh... I ride on a mailtrain, baby... 
can't buy a thrill..."
dylan, bob dylan


e que a noite chegue para que nada se apague, para que algo puro dure, para que o nome que alguém no futuro der a isso tudo seja o mais parecido possível com amor.

amor, por isso vivo. viver nos cantos sujos de um mundo ditado por poucos, responsável por muitos, renegando aqueles que seriam os novos guardiões de um tesouro maior que não chegou a ser nada além de um sonho bom de domingo cedo... 

debaixo de um sol calmo... que seja amor.

que a noite chegue abençoando a cegueira absoluta e todos aqueles que se alimentam dela... 


que a lua nunca nos deixe descansar.


***


foto por mim mesma.


19.8.10





I put it in a... song.


***


18.8.10




i... confess.


***






it is... believing.


***


17.8.10






então que eu... amo.


***


despreparo...




então que me deixe ser. 

que os dedos fiquem presos aos meus cabelos já que nunca tive medo da imagem turva que a memória teima em não apagar.

o gosto dos dentes contra a carne ainda fresca depois de um banho qualquer... ela estava preparada para que aquilo que estava pronto para acontecer a seguir não fosse apenas mais uma noite em suas vidas. eles eram como feridas abertas que resistiam e resistem e lutam contra aquilo por trás desse sistema ruim. sistema esse eternamente usado como único mecanismo de apego a essa inútil sobrevivência subserviente. sim, corpos prontos para quebrar tal mecanismo, por uma hora ou duas, três ou talvez cinco. eles nunca se preocupavam em contar o tempo como quem conta hora ruim... no fim das contas, a dívida seria imensa.

o banho não tinha sido um qualquer, foi o previsto. por tanto  esperado e minuciosamente desejado.

a água que corria e escorria pela sua pele teria pouco o que contar em relação ao que ele teria preso no peito, para guardar como seu para um todo sempre quase sempre demais. um embaraço magistral de amor que ele nunca havia conhecido, pelo menos até se conhecer com ela.

como se vive assim?

não sei.

se vive?

acho que não. se espera.

pelo viver?

pelo você perto de mim, novamente.

e isso, é viver? e se estar é viver, o que é o esperar?

é o não ter, temporariamente.

não ter, não ser. o verbo que é o mesmo em tantas línguas teima em ser dois nesse português bem gasto... e nos empurra a voltar ao que é necessário para a sobrevivência. o desejo é muito, cobiçar é querer em dose tripla tudo o que se espera do mundo. afinal os frutos são o que são, nascidos da mesma terra que nos deu a vida...

o fruto é um e se não fosse um, seria todos. o que eu quero eu quero em um, inteiro. e só pode ser inteiro quando é comigo.

o que é isso que eu quero? esse gosto de um...

um gosto que a gente não esquece, um cheiro que não larga, uma textura fina demais que foi feita para ser entregue a farta falta de escrúpulos da nossa sede...

ah, essa sede.


ninguém aprende a passar por isso...




***


4.8.10

i wanna steal your innocence








....eu não sei ser mais do que sou. espontânea alienação.


antes da meia noite, depois das duas. dois, entre ontem e o hoje, amanhã? não tem mais. se eu pudesse ter um gosto, apenas um, escolheria o outro. além de mais gostoso é também o mais difícil de se ter.


um som? duas mãos que não as minhas. uma voz que não a minha. o cabelo que seja sim o meu, o resto de uma história que não tem jeito, nem volta, nem norma. 


um tempo que não foi, pois não pode ser sob a luz de um dia bem claro, daqueles que derretem geleiras nos himalaias. e quem quer a luz? que bicho é esse que chora feliz debaixo de um sol mesquinho, cego, tirano? ninguém. nem eu mesma. sozinha apenas. 


calada em mim. afogada.


o escuro resolve as coisas que vivas, sabem de si e do outro. o escuro ensina a querer mais, desgraça de quem não teme. quem responderá tal insulto? deixar ser o que se é, por pura e plena negligência de um hábito que não é humano. não me venha dizendo o que é e não é humano...


dele, só eu sei. dela, ninguém sabe. ela é um humano diferente. *






existe um momento, entre o agora e algumas horas atrás em que o sol bate na janela da maneira certa. 

as folhas da palmeira californiana, o sol, a tela e enfim o vidro da janela.



quantas janelas já ficaram como lembrança? 

por quantas realmente vivi?


***





3.8.10

"nunca mais vamos nos rever tão jovens..."



***

eu fui, eu voltei, eu repeti a dose. falei mais do que devia, menos do que esperava, senti tudo o que não pretendia, repetia tudo o que não se revela. o que a gente faz dá em árvore? é fruto para a saciedade de alguém caindo de fome em algum futuro distante ou o que a gente faz é erva daninha, resplandecendo em ódio tudo o que toma como seu sem ao menos a decência de se manter friamente desligado daquilo que domina?

viver dentro de uma janela dá nisso. ou melhor, dentro de uma tela, a tela que tem fim, cantos, diâmetros. o que não se enquadra não se sente? o que não é visto não pode ser usado contra você? o que tem gosto não se presencia enquanto a luz, apenas a luz tem voz (e vez)? 

enquanto pares seguem secos e perdidos, partes seguem sem dano e sem abrigo ou será que sou eu que penso em um ritmo ináudivel a quem vê e espera de menos?



***