20.12.10

baby, think ya used enough dynamite there?


'boy, I got vision, and the rest of the world wears bifocals....'


Butch Cassidy, personagem vivido por Paul Newman 
(os olhos azuis mais amados da minha mamãe)



Uma das minhas atividades favoritas é ficar quieta. Prestar atenção no que geralmente não recebe nada da mesma, regular em mim o desejo de se desejar: um tormento, para aqueles que me conhecem. Mas sim, gosto de fazer com que isso seja rotina mesmo que a rotina em si não permita; o truque é manter o truque vivo.

Seguindo...

Numa 'conversa' entre Martin Scorsese e um bando de louco (eu tava la) ao vivo num teatro das antigas aqui em Hollywood (eu moro na área, para aqueles que não sabem que eu não to mais em Gotham), alguém o perguntou sobre como ele se sentia em fazer 'filmes de época', e é claro que o Mr. Director respondeu qualquer coisa de estonteante sobre tais películas (você não ama o som de um Argentino falando essa palavra com gosto?). O que ele disse?Com aquele olhar de nerd debaixo de óculos maiores do que a própria cara, Marty sorriu nervoso e disse 'não existe isso, filme de época? o tempo é agora, o ontem é o que vivemos hoje, o que viveremos amanhã, nunca vi um filme sob esse ponto de vista, a época não vai necessariamente fazer da história algo mais ou menos importante pros tempos atuais' e seguiu com o seu discurso tímido mas no ponto: o tempo é agora.

Hoje, enquanto ficava quieta como é de costume, pensei nisso. O rabisco de chuva lá fora que já dura três dias, coisa atípica em Los Angeles, manteve o ar do aqui de dentro ainda mais acolhedor e na TV (monitor grandão extra ligado no meu notebook, não tenho televisão) passava um filme 'velho' mostrando imagens de certos rapazes lindos e familiares, deixando algumas frases tão comuns reverberar na minha caixola enquanto o pouco do que fazia sentido se mantinha adormecido...

Um daqueles rapazes já morreu: Paul Newman. O outro continua vivo e enrugado, cheio de projetos que geralmente são recebidos com alguma resistência e narizes tortos por meia indústria (Hollywood) ou são aplaudidos com louvor pela outra metade. Eu nunca fui muito com a cara do segundo mas ando mudando de opinião. Antes ele representava coisas chatas e sem criatividade, hoje já vejo tudo o que ele faz com outros olhos. Já com o Paul Newman as coisas sempre foram diferentes, sempre amei my cool Luke e seu sorriso gostosão e olhar que sempre derreteram o coração da minha santa mãe, a Lucinha... 


A questão é que, tudo o que se passava na história diante de mim, o conteúdo do olhar de um, a carga emocional na voz do outro, as palavras e cenas repetidas sem cansaço pelo projetor (gosto da palavra, não que eu tenha um 'projetor' sobrando) me lembraram que nada, absolutamente nada mudou e que o tio Scorsese tinha plena razão, o tempo é agora.

O filme, feito em 1969 mostra uma época completamente diferente da minha - também diferente da época em que o filme foi feito, já que a história se passa no começo do século 19 - com valores e formalidades que hoje não existem, com uma tecnologia boçal e proto-histórica mas com qualidades humanas imutáveis. Com detalhes que talvez não se repitam na história com as mesmas personagens mas com outros... que vão sempre manter a qualidade bruta que tanto amo em nós, membros dessa raça imbecil: a resistência contra tudo aquilo que não é realmente simples que no fim sempre ganha.

Ou será que eu claramente sou cheia de esperança estúpida demais? 

Quem sabe... 'it's a small price to pay for beauty' he says.




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17.12.10

o agora.


---porque a gente lava a louça ouvindo Chico e presta atenção na chuva lá fora com a Elis. as memórias tão vivas como filme fresco rodando num projetor na parede branca do prédio do outro lado da rua, a mãe que tinha mãos tão fortes e precisas como as minhas que por algum truque da vida aprenderam a se cortar constantemente. o cheiro... o cheiro de café, canela, sabão e forno aceso tudojunto, tudopronto. o pão, o verde e as ervas sobre o queijo... o azeite. o beijo molhado que não se espera, o aperto no peito...

e o meu amor que não vem.

***