31.10.07

patrino, mi amas vin

ela tinha os pezinhos curtos, mal tocavam o chão. algo a ver com sua pouca idade ou talvez pouco tempo exposta aos olhares curiosos de todos que vivam naquela terra colorida e estranha, como era estranho ouvir os dedinhos tocando o gelo encrostado nas rachaduras entre um quadrado rosado e outro esverdeado, como era estranho a ver abrindo os olhinhos no meio daquela gente.

a primavera havia chegado no lugar estranho, os sinos tocavam durante todo o dia, anunciando cada botão de flor novo dando mais cores vibrantes a essa terra já tão vibrante, mas o céu, esse era sempre cinza e era assim que essa gente o conhecia.

quando ela abriu bem os olhos e entendeu que enxergava, todo o povo boquiaberto esperavam por ela, como se estivessem assistindo alguma deusa chegando à terra, e realmente era o que se queria ver. o som dos pés aquecendo o gelo e o derretendo, o som da barra do seu vestido lentamente sendo carregada enquanto ela caminhava. cada passo era uma nova lágrima no rosto de uma mãe, um sorriso no rosto de cada filho... o céu porém continuava cinza.

seus cabelos negros azulados se movimentaram com uma leve brisa que tomou sua atenção, com ela veio o sorriso, a gargalhada doce como de uma criança que ficou mais intensa com cada novo movimento no vestido até que finalmente o laço que envolvia sua cintura se foi junto com o vento, o laço que era azul claro do vestido branco se foi e os olhos da menina alcançaram o céu em busca da sua fita colorida...


o céu era cinza.




o vento perdia força, as pessoas observavam a garota que gradualmente perdia o sorriso...

seu rosto e seus olhos procuraram as cores em volta, debaixo dos seus pés e em suas pequenas mãos, ninguém entendia o que acontecera.

ela voltava sua face para o céu cinza e gritava, "não!" era o som que saia de sua pequena boca, de seus lábios que estavam mais vermelhos do que nunca. seus punhos cerraram e seu pequeno corpo se jogou contra o chão colorido. tijolos amarelados, azuis, verdes, rosados, alaranjados e afins carregando o peso daquele pequeno corpo, de toda aquela tristeza.

aquelas pessoas nunca haviam visto a pequena menina tão aguardada, a grande mãe e filha de todos tão perto e não esperavam tal reação vindo de alguém tão brilhante. o céu afinal, sempre foi cinza! era o que pensavam...

de repente, o rosto da menina se voltou para o céu novamente e entre gritos e suspiros e lágrimas nos olhos, os sinos deram lugar aos violinos que aguardavam por esse momento... o violão celo também acordou e as harpas finalmente se voltaram para o grande palco. as vozes todas entraram em harmonia e toda aquela nuvem cinza foi abrindo espaço, as teclas do piano estremeceram, chovia de dentro dela e seus pequenos olhos pretos se esvaziavam, de seus lábios vermelhos os sons carregavam notas de comando e todos agora se ajoelhavam observando a cena mais linda jamais vista...


ela, tão pequena e tão jovem, havia espantado o cinza e dado ao céu o tom de azul mais bonito. era tão lindo que ninguém saia mais de casa sem antes olhar para o céu e suspirar, pensando onde será que aquela criatura agora estava depois de tamanho feito...