30.6.11

das cartas que não foram: dallas, tx.





Will,

Aqui os dias são eternos.

A luz parece que corre sem medo por detrás da terra enrugada que, sem descanso, responde preguiçosa, fique mais, fique pelo tempo que for... Você tem tanto o que fazer por aqui.

Sim, o sol tem tanto o que fazer por aqui, mas eu não tenho não e não terei até a hora de você chegar. Nesses dias em que os dias são eternos, as noites são curtas e respondem rápido. A reação é sempre a mesma: recolha-se. Ele já vem.

Pois eu nunca ouvi isso dos teus lábios, meu amor

Você já vem, acredito. Com o vir trará qualquer coisa parecida com culpa, creio eu em minha infinita bondade quanto à sua pessoa. Trará também uma indecisão digna de alguém frágil escondido num corpo cheio de peso de homem do tamanho certo. Trará fome e carne, tudo no mesmo pacote. Trará o que sobrou de mim de volta para o berço. O começo de tudo. O seu começo.

Eu aqui vivo por você e espero diante de uma janela generosa demais. O sol dessa terra ri de mim enquanto a lua espia com pouca vontade. Enquanto o tapete estiver torto e o quadro um pouco manchado, as velas mal arranjadas e as flores levemente murchas, essa terra continuará a esbanjar dias eternos.

E, devo perguntar, como viver dias eternos sem a dedicação abandonada ao momento em que te sacar será como presenciar a grande diferença entre o dia e a noite? Será essa a única realidade que conhecerei? Viver à espera de uma promessa silenciosa.

Eis o peso e o prazer de cuidar de viver mais dias desses dias eternos.

Até que essa o encontre com saúde suficiente para que a resposta seja a sua presença pronta para a minha fome.

E lembre-se, dias de sol são só dias de céus de um azul intenso.

É.


Laura A.,

27 de setembro de 1992,
Hospital Psiquiátrico de Timberlawn - Dallas, TX.



foto daqui.