30.1.09

when the squirrel meets the moose

há um ano o sol reluzia num tom muito mais alaranjado do que o de hoje -- que quase brilha na mesma intensidade, mas não da mesma forma -- e a pouca brisa me forçava a não querer carregar casaco nenhum. meu vestido comprado por quinze dólares numa loja qualquer repleta de crianças mexicanas correndo pelas araras e corredores, me forçava a usar algum sapato bom, que eu realmente não tinha, coloquei meus tênis mesmo. ele, ah ele que não é nada convencional colocou gravata, perguntei porque, respondeu quase sem pudor: "porque esse não é um dia como os outros". ah não e não foi não, como seus olhos não são como os de outros, como sua simplicidade beira a inocência perdida pelo mundo que poucos outros tem... nos perdemos no caminho. sem carro, pegamos um ônibus, ele passou do ponto, no outro perdemos o próximo e assim eu óbvimante me desesperei, é hora de pegar um táxi. chegamos e entramos, uma salinha simpática, os corações nas bocas, os olhos -- de ambos -- cheios d'água, a certeza. o sol lá fora já não era tão forte, o vento soprava intenso enquanto caminhávamos por Beverly Hills, um lugar que por muitas razões não nos fazia sentir que tudo estava tão longe, e a noite chegava cheia de vida. os anéis -- dez dólares por cada um numa barraquinha na frente do teatro chinês -- nos dedos e a pintura envolta dos olhos borrada.


mais hollywoodiano, impossível
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29.1.09

jogo literário

Nina Rizzi me fez um convite para um brincante jogo literário. o negócio funciona da seguinte maneira, o cidadão deve pegar o primeiro livro que achar, abrir exatamente na página 161, depois procurar a 5ª frase e colocá-la inteirinha no blog, e por fim, generosamente que o mesmo convide mais 5 pessoas para entrar na roda dessa brincadeira, eu que não gosto de repassar muita coisa vou deixar aberto para aqueles que lêem o ilumine, da mesma forma que fez meu amigo Eduardo P. L. aqui está minha frase:


"As figuras na parede, eu as reconhecia com um novo modo de olhar."


do livro A Paixão segundo G.H. de Clarice Lispector.



FIM!


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27.1.09

a devoção segundo consta... - continuação?



Eu fervilhava o suficie
nte para a água nunca ferver nem derramar. - Clarice Lispector












? Os braços haviam desaparecido. Está aqui, Luí? Luí? Nada. De repente o escuro se tornou norma e meus olhos se arregalaram buscando por ele. Acalmaria minhas dúvidas se tivesse por minha vida alguma ainda presa por um fio amarrado em volta do pescoço, mas não, Luí era nome inventado. Sua história mudava a cada segundo, sua origem variava de árabe a sul-africana. Sua profissão muitas vezes moldava seus lábios, seria ator? Não... convenhamos, com aquela fixação com o diverso deveria ser ator. Não era. Muitas vezes era mecânico. Pararia diante de um senhor com problemas no seu carro antigo enquanto fumava apressado, levantando o capô amarelo e falando com categoria exatamente o que estava errado com o motor do pobre. Por vezes era pescador. Muitas vezes me chamava no cais enquanto ainda estava a puxar a rede de volta, ele e mais alguns. Não sabia nome de ninguém, reparava em tudo de longe, ele percebia quando chegava logo e assim que terminava corria a minha direção, nunca perto de cheirar ao que acabara de pescar, o que me parecia suspeito -- era tudo muito suspeito, tanto quanto eu o era. Luí era uma idéia e no momento que finalmente aprendesse a entender isso, por ventura de minhas impossibilidades o teria longe e ao mesmo tempo invariavelmente próximo a mim. Fechei os olhos contente. Satisfeita por algum tempo. Me forcei a me forçar, deixei com que tudo que Luí decidisse como meu destino fosse meu e pronto. Era. Aqueles mesmos braços -- minto, talvez fossem outros, talvez tudo era uma outra faceta de Luí, ou da idéia que ele como nome mas não como um poderia vir a ser -- me envolveram como algo que pedi, um pedido assim cálido, num momento de lucidez e ele prontamente resolveu me atender. "Pronta?" agora sim Luí, "então venha". Eu fui, e pela noite que dourada parecia ser entrei, sem meios de pedir socorro ou dizer até mais, não saberia se seria a última vez mas pressentia que seria, de qualquer forma seria. Em seis minutos -- eu havia contado -- estávamos sobre a Pont Des Arts e as grandes mãos de Luí rodeavam minha cintura. Enquanto a aragem que permanecia constante mantinha nossos rostos livres de estorvos menores, suas mãos me mantinham firme e presa a sua essência que era o que me importava e nada que tivesse nome ou timbre. Seus olhos rogavam por mais, eu os percebia, seu rosto quase disforme por causa de tamanha junção de ideias em seu ínfimo ser, a cicatriz entre as sobrancelhas... Murmurou em seguida coisas obscuras, palavras de um trem que não havia tomado mas que sim, havia levado seu eu mais precioso, seu medo. Me deixou a postos, me manteve sã e sentou sobre a mureta que mantinha as pessoas dentro da passarela. Não temi, não deixei oscilar o meu meio entre todas as coisas. Ouvi. "Nunca quis mais do que viver", seus pés tocavam de leve a estrutura de cimento e sua massa parecia insignificante ao espaço que ocupava, tudo girava em torno dele, "mas viver apenas é o mal querer daqueles que não podem", pouco entendi daquilo e lembrando-me agora sei que não prendi absolutamente nenhum significado do que partia de seus lábios e agradavelmente viajavam aos meus ouvidos até então subalternos e idealistas. Minhas penas se dissipavam, o vento não poupava ninguém. "Por isso que, se pareço vão aos teus olhos, não olhe por cima. Veja mais adiante." Seus olhos se voltavam aos meus, sua boca pronta para falar não exalava, compreendi. Não vejo por cima, Luí, "vê além?", mais do que isso... vejo o que quero ver e nunca o que me parece ser, "seria perfeito se não fosse seu, Manú" mas é. E era. Seria o perfeito sobre o canal, seria a mistura de falta de cores que transformavam o dourado? Seria. Era qualquer que fosse a pessoa que eu era para ele que importaria. Luí me agradeceu. "Manú?", sim Luí, "vamos embora daqui." E fomos.



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e tem mais...

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tem capítulo novo no Eu Lembrarei Abril! se ainda não tem o acesso e quer ter, deixe registrado nos comentários!

dona doida agradece...

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25.1.09

a devoção segundo consta...


A vida humanizada. Eu havia humanizado demais a vida. - Clarice Lispector



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. Ele caminhava pardo e com aquela cicatriz entre as sobrancelhas. Era parte dele, já sabia. Vinha fresco. Pá dá dí dá dá, vinha fresco cantarolando e o frio parecia não o incomodar. Um paninho fino, uma escarpe quase feminina abraçava o pescoço. Abraçava como o cheiro que dele vinha, um perfume que só ele tinha, parecia arreigado em mim quando o via, percebia de longe o cheiro que dele vinha... Era meio dia. Passava ali a diante um senhor que de qualquer não tinha muito. Era ávido por qualquer coisa que eu não havia percebido o que e logo depois dele passou Luí. As catedrais eram quase azuis, “bobagem”, ouvia já sua voz do lado de lá, “bobagem!” repetia em tom de Luí, o que seria tom de Luí? Tom de quem faz pouco caso, pouco a pouco faz-se de desentendido. Faz-se de... quem. Quem? Quem é, qualquer coisa que seja e que é. Entendi. Ele resplandeceu em sol assim que pisou na calçada em que eu estava estacionada. “Aprendeu?”, o que? Perguntei afoita. “o caminho”. Como se não soubesse desde sempre. Tirou um cigarro amassado do bolso. “o último” e o acendeu contra o vento, era dessas. “Pronta?”, claro. Luí parecia saber onde me levava-- mesmo no fundo achando que não -- e como todas as outras vezes eu deixava. Me arrependia no meio do caminho, era sempre uma caminhada longa, gostava de se embrenhar pelas ruelas quase medievais, “sim, medievais são” enquanto minha cabeça percorria seus detalhes mais meus, seus fios soltos no vento frio que cortava o meu rosto mas não parecia o abalar. Luí era como o chamava mas esse não era seu nome. Era inventado. Nunca havia dito o meu nem sequer de onde vinha, mas ele sabia que não era dali, como ele também não era, mesmo assim o mapa parecia ter sido inventado a partir de sua mente perversa, sempre pronta para me manter atenta. “viu aquilo?” o que? “nada”, se me perdesse riria da minha inocência, precisava me manter acordada, ele gostava de me iludir sem meias palavras, eram das inteiras que gostava, as devorava. Luí, gritei faceira, queres sentar ali?, pelo tom da minha voz que o acompanhava sabia que me referia ao café que levava o nome de Cafe Des Deux Margot, “besteira”. Continuava a passo de rei, “tens algum cigarro?”, não fumo, Luí. Ele sorria. Seu perfil refletia em vitrines esfumaçadas, nariz grego e tosco quanto tosca era a minha alma, começava a ameaçar algum tempo ruim. Suas mãos buscavam pelas minhas detrás de suas costas severas, agarrava cada centímetro dele que conseguia com minha pele, músculos, unhas e ossos frios, “não me deu nenhum beijo ainda? Que acontece com o seu bom senso?”, atrevo a querer mais de Luí, quieto em tempo bom, cinza... bom. Cruzamos a Jacob. Percebia aqueles olhos querendo ver mais do que notavam as circunstâncias, logo estaria mais próxima do seu corpo, era assim que acontecia: deixava com que o tempo de passeio fosse alguma coisa como um prólogo para o que sabia que viria logo adiante, um braço em volta da minha cintura... Luí sorriu e pela primeira vez naquela tarde olhou firmemente em meus olhos. Era para tirar meu fôlego mas não o fez, regenerava o que era para ser meu. Anteciparia minha dor no peito e a trocaria por sonhos momentâneos. Ah... teria eu pena de mim mesmo? Luí saberia. Luii, teimava no i... “Pare aqui”, aqui? “é”, uma chuva miúda me forçava a contrair os músculos da face e Luí colocava suas mão pesadas sobre os meus olhos, respirava devagar enquanto seu sopro embalava as oscilações do que saía de sua boca, “não adianta tentar olhar”, não tentaria... Gostaria de ter alguma intuição divina que me preparasse para aquele indivíduo que se desdobrava diante de mim, do meu peito escancarado e sem medo. Estaria pronta para desatar os nós que me prendem a mim mesma? Estaria se Luí escrevesse assim. Ele escreveria. “agora, pode abrir”, o sol, “isso”, o sol morrendo por detrás da cidade, “é o milagre da paciência”... o respirar prendia nós dois em uma pedra que parecia flutuar, “é um milagre, vês?” vejo. Enquanto o fulgor acrescentava um tom ainda mais profundo a tudo que adornava com rigor, Luí me guardava em seus braços, ele havia cedido sua posição para que eu tornasse a ser primeira, primeira naquela hora de seu dia em seu tempo, primeira em deixar o sol se deitar. Eu aceitava. O milagre era também meu.



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momentos inesquecíveis (alice sendo melancólica) parte 12

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Beverly: Let me quote myself. One day can change your life. One day can ruin your life. All life is is three or four big days that change everything.


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Personagem Beverly Donofrio interpretada por Drew Barrymore. Esse filme conta a história real de uma mulher que pecou por sonhar demais e ter que viver como qualquer outra, mais uma em um mundo de donas de casa sem sonhos ou qualquer esperança. Lindinho.


24.1.09


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se todos os meus heróis acabaram sozinhos, se todas as estrelas morrem antes de sentirmos o calor do seu brilho, se o mundo gira impunemente sem nunca ter pedido permissão à lua, pra que continuo? não sei. talvez por falta de opção. acreditar é sempre a melhor maneira de se manter são. são? retiro o que disse. de se manter.


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momentos inesquecíveis (alice sendo melancólica) parte 11


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Donald: At my interview with IBM after I graduated college, they asked me what my plans were, and I said, "Probably go to McDonalds for a 12-piece McNugget and two cheeseburgers, and then do my laundry."
Wallace:
Did they laugh, at least?

Donald:
They smiled and said they'd call me. They didn't.

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Donald, personagem interpretado por Josh Hartnett tem síndrome de Asperger, uma forma de autismo. Nesse diálogo: ele e o personagem Wallace, interpretato por Gary Cole. O filme conta a história de amor entre Donald e Isabelle que também tem a síndrome. Uma história verdadeiramente de amor e só.


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como alguns devem ter notado, restringi meu blog-livro "Eu lembrarei abril" para convidados, quem quiser continuar a leitura me mande seu email pelos comentários ou para o meu email mesmo que você encontra no meu perfil que eu ficarei feliz de mandar o convite de volta!
obrigada... e desculpe pela inconveniência
a quem estava acompanhando, mas c'est la vie!


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23.1.09

poesia emprestada, alma enganada



Meu amigo (eterno aluno) Gabriel Salomão publicou uma de suas poesias em seu blog que me deixou com a garganta seca. Pedi permissão para publicar aqui as palavras que me deixaram assim para poder dividir com quem me lê. Prestem muita atenção...


Esperei o meu homem sair,

Tomei banho, arrumei-me bem.

Retoquei maquiagem, troquei os brincos.

Penteei meu cabelo com mais cuidado.

*

Botei blusa nova, sapato novo,

Passei batom, hidratante e perfume.

Liguei pràs amigas, combinei cinema,

Jantar, danceteria e asilo.

*

Arrumei a cama, arrumei os vasos,

Ele sempre gostou muito do jeito

Como eu sempre arrumei os vasos.

*

Limpei a sala, os quartos e seus livros.

Passei pano nas estantes, nos móveis,

Escova no sofá, nas poltronas

E escovei os dentes.

*

Deixei três camisas passadas no armário,

Duas calças nos cabides e cinco gravatas.

Abri dois pacotes novos de meias,

Deixei roupas discretas limpas e guardadas.

*

O tênis do fim de semana, das caminhadas,

Deixei tomando um pouco do sol do dia.

Também deixei dois lençóis, brancos, macios.

Dois lençóis dos que ele mais gosta, um na cama,

Um no armário, cheiroso como se fosse novo.

*

Deixei sopa na geladeira, um pouco de arroz,

Dois bilhetes na porta branca, bilhetes brancos

Com instruções, telefones de faxineira,

Rotssérries e pizzarias.

*

Ajoelhei na frente do fogão, para ver uma torta,

Se estava pronta para o meu marido.

Tirei a torta, mas deixei o fogão aberto, respirava.

Desliguei o fogo sem desligar o gás.

*

Ouvia seu carro à frente de casa, as palavras,

Avisando como sempre, que chegava e queria comida.

Sobre meus sapatos altos e pretos, com meu vestido,

De renda e decote, que mostrava o que devia.

*

E com a mala nas costas

Virei pro meu homem e disse:

Amor, nosso gás acabou.



***


22.1.09

lembrarei...



para quem quer me ajudar...


mais capítulos AQUI.

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ladeira


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"um tapete é feito de tantos fios que não posso me resignar a seguir um fio só;
meu enredamento vem de que uma história é feita de muitas histórias."


clarice lispector
em legião estrangeira





pois se a história segue a história em linhas curtas e sutis, a vida segue uma lógica fora de mesmices, fraca por entre a lente e a faca. creio que a lente segue-se afiada como a rua que a toma e arredonda a ponta da lâmina. eu sei bem. o dia que chegastes eu era plena. no dia que partires serei meio termo. o ovo ainda anda por debaixo da mesa e os cães não cansam de latir. muda eu sei ser em dó, mas ao calar definitivamente secarei o pão, cansarei as costas, terei erguido uma haste fajuta, lavarei a alma em água cândida, em cloro raso. eu nunca aprendi a ressurgir cansada fora do fundo escuro, me sustentava manter-me cabisbaixa reaprendendo um jeito todo novo de respirar, mas não posso ser assim. as linhas se cruzam nesse infinito de redes encobertas. eu penso. penso demais por querer sentir.


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21.1.09

primeiro dia...


é. o primeiro dia de Obama na presidência promete. não é meio-dia aqui nos EUA e ele já mandou encerrarem todos os julgamentos em Guantánamo Bay, ele quer fechar aquele barraco! dá-lhe!

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20.1.09


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O cinema é pra ser visto com olhos d'água. Repletos de embevecimento, cheios de outras horas e histórias, mas calmo. O peito em compensação deve estar despovoado de martírio. Ir ao cinema condiz com o estado de ser sem ter de estar repleto de si. Arte menor? Meu focinho. Arte vendida? Como todas. Entretida. Arte entristecida com o que deixou de ser. Arte malograda. Blasfémica aparência mesquinha. Arrogante feitores do bem e do mal de mãos dadas, atadas até o túmulo, deus dos deuses, o túmulo de muitos que ousaram perguntar "quem me causou tamanha dor?". Pavimento de enredo e comoção por obscuridade. Silêncio no caos. Cinema á para ser engolido com lábios de exaltação. Dentes presos no teto quente.


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imagem: stanley kubrick

19.1.09

porque a gente precisa ouvir denovo, novamente e mais uma vez... parte 4

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"Nós, os que escrevemos, temos na palavra humana, escrita ou falada, grande mistério que não quero desvendar com o meu raciocínio que é frio. Tenho que não indagar do mistério para não trair o milagre. (...) Meu forte não é a humildade em viver. Mas ao escrever sou fatalmente humilde."


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18.1.09

the son, the cross and the woman



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ela entra.

palco denegrido. entulho.

preparada a cova para quem (não) canta.

ela entra. como um assoalho gasto. (quase) parte do cenário. cenário? não existe.

ela fala. respira em porções, aspira em pequenas inssureições. encanta.

(queimo enquanto observo, observo em meios)

ele espanta.

aparece em trama de veludo fino, rasgado, entra pelas frestas de fios abundantes. ele entra em cena enfim.

pausa.

as palavras que em suma são dele, seriam dela? seriam. dois passos. quatro mãos. um ver. uma chuva de males que não vem para o bem. ele toca a pele fina do rosto dela. ela. de ela.

cortinas aprazíveis quando a visão não é das melhores.

pé sobre pernas, troncos imóveis, crispados. mãos que batem umas contra as outras em estado de estupendo desalento.

(eu espio sem graça um fio de luz que vem de trás da cortina)

um troço que parece beijo remenda nós incalculáveis.


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"(...) Acho que não gosto de nada do que vejo, vejo sal. Vejo ferida e sal, não me convêm. Enquanto abordo minha própria existência sou impelida a me redimir por terra. O que será que eu fiz pra merecer isso? O jazz toca. Certas vezes me incomodava, como se chama isso quando a luz está baixa e o som quase não existe mas é tão intenso que te toma sem tomar? Sei lá. Chamo de jazz. Devo ser autista, às vezes me pego sentindo prazer em focar, focar, focar com tamanha intensidade que me cai em dilúvio o senso crítico. Será? Será."



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fotos: chapéu de Lester Young, Billie Holiday, Dexter Gordon e Sarah Vaughan. Todas de Herman Leonard.

17.1.09

depressão pós divino


existem certos momentos em que escrever no blog não basta. me dói o peito. como se o peito fosse de algodão fino e se desfizesse em plena brisa de dia comum em praia morna. meu peito se vira em praia morna. o redondo do olho não consta. tenho dito.


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15.1.09

tertulia de janeiro!


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mais sobre as tertúlias virtuais AQUI.



eu tenho que admitir que odiar é comigo mesma! se existe algo que sempre me deixou medrosa como um bicho estranho foi esse tal elemento, o fogo. desde quando meu quarto se incendiou inteiro e por um triz não me deixou desfigurada, algo deu um clique aqui dentro: como um peso que cai no lugar errado e por preguiça ou medo de se deparar com um monstro por debaixo dele, nunca o tirei do lugar. tenho certeza que muitos irão dizer que sim, o fogo como elemento é importantíssimo para se dar liga à vida, concordo. mas algo de primitivo me toma quando vejo uma labareda se agitar. enquanto tirito de frio num canto prefiro observar o fogo sem pestanejar, tomando conta do espaço que a sua volta cintila de encanto e se projeta de espanto. as poucas vezes que vi uma lareira acesa, todos os poros do meu corpo gritaram sem chegar a me deixar em estado de pânico algum - não tenho dessas - mas apenas me alertando, é como se o ardor me falasse entre suas cuspidas ocasionais: olhe, veja, esta me percebendo? me consumindo? me internando? esta? esta viva? o fogo me obedece enquanto o temo. eu o entrego tudo que tenho enquanto entendo. o fogo é maior do que eu, como o oceano que cobre essa terra e eu aceito. mas não necessariamente deixo ser.


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eu lembrarei abril...



e tem novos capítulos pelo blog
"Eu lembrarei Abril..."

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13.1.09

acorda!


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Ela havia decoberto a beleza que se morava no girar da corda. É. aprendeu a pular corda. Digo aprendeu porque sentiu como se sentiu daquela primeira vez que viu a corda passar sobre sua cabeça novamente sem levar um tombo, era quase como a primeira vez, seria se não tivesse sido. Em anos se perguntava se conseguiria, as palavras eram murmuradas baixinho numa fila no supermercado enquanto observava uma caixa que continha uma corda- -imitação das clássicas -- e a imagem de uma moça se divertindo e pulando... Pensava também que seria uma besteira voltar a fazer algo tão... infantil. Pera lá! Gritava ela mesma para que sua identidade a ouvisse, pera lá e não se mate por isso. É uma corda! Agarre, porque é pra isso que ela serve e vá contente pra casa. Não sabia se era meu eu consumista ou meu eu criança, explicou mais tarde ao filho mais velho que já estava com seus catorze anos, mas agarrei a bendita. E enquanto sentia aquele calor nas têmporas voltava a pensar que era criança, como se nada nesse mundo realmente tivesse alguma ligação ao tempo.


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verídico


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"...are you Brazilian?"


"Yeah! How did you find out?"

"...well, you love life too much to be American!"

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12.1.09

novamente: alguém TIRE a clarice da minha vida!


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"Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo. Temos organizado associações e clubes sorridentes onde se serve com ou sem soda. Temos procurad
o nos salvar mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes.(...) Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar nossa vida possível."




porque uma hora ela vai me convencer a viver.


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“You’ll have to forgive me, I have a habit of not winning things.”

Kate Winslet

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Ainda bem que ganhou... merecidamente!



momentos inesquecíveis (alice sendo melancólica) parte 10


"I realized love won't obey our expectations, its mystery is pure and absolute."

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Francesca, interpretada por Meryl Streep no filme Pontes de Madison. Clássico é pouco, esse filme é uma ode à dor que sempre anda de mãos dadas com o amor mais puro e irreal que se pode existir... esse filme me enche -- no sentido bom da palavra.


porque a gente precisa ouvir denovo, novamente e mais uma vez... parte 3



"Ela se guardava. Por que e para quê? Para o que estava ela se poupando? Era um certo medo
da própria capacidade, pequena ou grande, talvez por não conhecer os próprios limites. Os limites de um humano eram divinos? Eram. Mas parecia-lhe que, assim como uma mulher às vezes se guardava intocada para dar-se um dia ao amor, que ela queria morrer talvez ainda toda inteira para a eternidade tê-la toda."

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11.1.09

sweet pumpkin

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Acho que Clarice me mataria se me visse descabelar tão frequentemente. Sei que Rimbaud se enjoaria de mim. Os constantes pedidos de afeto o regulariam e me deixariam na mão, enquanto a estrada o chamasse eu faria pirraça tirando o pó do chapéu redondo dele que teria roubado em seu sono. De certo Hilst daria risada e fumaria mais um enquanto Baker tocaria quietinho no canto com medo da polícia. "Branco não tem que ter medo da polícia", "Mas amore, não estamos mais nos anos cinquenta e aqui não é ali"... Alguém me pergunta se eu gosto de Davis, eu respondo que não. Coltrane faz mais meu estilo mas não rasgaria a camisa por ninguém, nem mesmo por McRae, talvez por Billie -- mesmo sem engolir minha candura. Certamente Oscar se irritaria comigo e minha "simpatia" por todos aqueles que são injustamente chamados de underdogs, me daria algumas baforadas na cara e me deixaria a sós em algum canto escuro, enquanto Sylvia me daria a mão e me ensinaria a temer. Me mostraria o mundo com desdobras nas entrelinhas enquanto o sol se colocaria ao seu favor. Adoraria ver os cabelos ensolarados dela emoldurando tamanha escuridão. O incrível é que com razão Yates escreveria um livro sobre mim, contando meu fim nessa jornada vazia e sem esperança. "É necessário muita coragem para perceber a falta de esperança", eu diria que sim com a cabeça -- nada é tão certo quanto falta de esperança -- e voltaria a um banco em uma praça qualquer, tomando um ar.


Sei tão pouco de mim e ao mesmo tempo sei tanto do que se passa aqui...


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'For me, acting is tortuous'



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santa jolie, angie jolie

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quando santa Angelina estava por volta dos seus nove, dez anos, o seu professor mais amado por todos no colégio acabava de receber a notícia que seria desligado da sua posição já que a instituição não conseguiria pagar seu salário. mais que prontamente, Angie e seus coleguinhas começaram uma campanha para arrecadarem a quantia suficiente para que ele felizmente, não fosse mandado embora. fizeram tendas para vender cookies na porta da escola, passeatas em volta do campus e pedidos aos pais e vizinhos para ajudarem na campanha. naquele ano, seis professores foram demitidos, mas aquele por quem Angie lutara permaneceu. nascia ali uma santa.


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fonte: HTS - E!

10.1.09

a questão não é o "qual lado está certo", a questão é: GUERRA NÃO SERVE PRA NADA QUE VALHA A PENA.




"yeah baby, burn!"



"It is remarkable that over seven days of wartime trading, the Tel Aviv Stock Exchange's flagship index actually WENT UP 10.7%. When carrots don't work, sticks are needed."

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me tira o sono




"É talvez anti-semita reler Hannah Arendt hoje, em que nós, os palestinos, somos sua escória da terra, é anti-semita voltar a iluminar essas páginas sobre o poder e a violência, sobre a a última raça submetida ao colonialismo britânico, que teria sido, enfim, os próprios ingleses? Não, isso não é anti-semitismo, mas o exato contrário, defender os numerosos israelenses que tentam escapar de uma nakbah chamada sionismo. Porque não se trata de um ataque contra o terrorismo, mas contra o outro Israel, terceiro e diferente, à medida que se esquiva do pensamento único cerrado entre a cumplicidade da esquerda e a miopia da direita."


Mustapha Barghouthi

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matéria inteira AQUI.
indicação de Victor Barone, para ler seu blog clique AQUI.

9.1.09

Émilie...

"so one can be happy, one must be susceptible to illusions, for it is to illusions that we owe the majority of our pleasures. Unhappy is the one who has lost them."
Gabrielle Émilie Le Tonnelier de Breteuil, marquise du Châtelet







Existe gente para todos os gostos e mais, para todos os
gêneros. Caí de paraquedas em um artigo no meu jornal online favorito, o Guardian.co.uk que contava a história de uma tal Marquesa chamada Émilie du Câtelet. Aparentemente ela quase inventou a roda, mas os homens que mandam no mundo esqueceram de manter os créditos junto da pessoa. Conhecida históricamente apenas por ser uma das amantes de Voltaire - sim, ele mesmo - Émilie, matemática auto didata, já tinha um pé na teoria da relatividade bem antes de Einstein se quer existir, e seus estudos sobre a luz ja davam amostras do que viria a ser a base para que a fotografia viesse a ser algo real. Seus estudos eram variados e sua vida foi contraditória. Alguns dias atrás encomendei o livro que fala sobre sua vida, escrita por uma pesquisadora que se desdobrou em muitas para chegar o mais próximo possivel do que foi a vida dessa mulher esquecida pela história. Para se ter uma idéia de quem ela foi vou me entregar a essa leitura, e quem sabe volto com mais detalhes...


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mestre jopi!

no fantástico blog Expresso da Linha, respondi ao questionário do Mestre Jopi e não me contive em publicar o que me respondeu:


MESTRE JOPI said...

Alice: Uma mentalidade inquieta. Um espírito permanente revoltado. A vida é para si uma alegria a que esqueceram o "tira-gosto". Uma lutadora idealista e convicta. A crise não é para si uma surpresa. Surpresa é ser só agora. Vai tirar partido da crise para inventar um outro eu que sairá mais forte e independente. Remar é preciso!


Acho difícil existir melhor "conselho"que esse!



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8.1.09

the lamb of god



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Bom, se motivo pra discussão existe, motivo para discussão será o tema.


Enquanto o mundo desaba em Gaza, civis, fundamentalistas e crianças inocentes morrem todos como se fossem farinha do mesmo saco e Israel ainda tenta achar justificativas extravagantes para se continuar a matança, o nosso querido Obama e mais quatro presidentes Estadunidenses jantam na Casa Branca regados a sorrisos marotos e confiantes. É. Chove canivete, mas não na horta deles. Enquanto discussões candentes desenredam histórias sem fim sobre quem está certo e quem está errado, eu me aflijo. O mundo pede que sejamos insípidos então que assim seja. A discussão religiosa que, a beira de mais uma década de vida para esses humanos antiquados, insiste em ser renovada merece extermínio e meu acanhamento merece a forca. Os tempos nunca mudaram, ninguém nunca encontrou a luz da evolução, os dias nada são além de grandes e infelizes massas de pensamentos ajustados à uma forma irregular de humanidade ou de qualquer coisa que essa palavra tenha sido inventada para ser. Eu me admito. Tenho pena de mim mesma. A objetividade de qualquer situação que envolva SANGUE é sempre inconstante, o mesmo que jorra pela testa franzida por falta de candura, é aquele que rola dos joelhos de criancinhas mimadas em um colégio qualquer no recreio. Eu me permito. Sentir essa dor alheia sem reluzir em palavras minha única justificativa para ser resultaria em morte bruta por asfixia em ignorância e minha pequena alma não conheceria sossego -- será possível chamar isso de sossego? Palavras abatem ânimos, estou ciente disso. Mas enquanto os céus existirem, ou pelo menos enquanto acreditarmos que sim, -- existe um céu sobre nossas desprezíveis cabeças -- os mesmos estarão fervendo de ódio contra uma raça que pôs fim ao ser, seja ele quem for.


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momentos inesquecíveis (alice sendo melancólica) parte 9


Justin: Be reasonable. There are millions of people, they all need help. It's what the agencies are here for.
Tessa: Yeah, but these are three people that WE can help.

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Personagem Justin de Ralph Fiennes e personagem Tessa de Rachel Weisz no filme de Fernando Meirelles, The Constant Gardner. Toda vez que assisto, termino o filme chorando de frente para o espelho e me perguntando "o que eu ainda estou fazendo aqui?".


gaza strip, the untold story


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quer ouvir de alguém de dentro? um ser com um propósito a fim de mostrar a quem não quer ver o que acontece.
CLIQUE AQUI.


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aviso"zinho"


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Mais capítulos aqui.


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7.1.09

porque eu amo a anistia internacional...


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fotos vindas daqui.










"It always comes back to the complexity of the individual and understanding the nature of our own being. The more we understand, the more chance we have of decreasing the horrors of this world"


John Hurt


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nas fotos, de cima para baixo: John Hurt,
Chiwetel Ejiofo Will Ferrell & Adam Mackayr, Archie Panjabi, Saffron Burrows, Lauren Laverne.


porque a gente precisa ouvir denovo, novamente e mais uma vez... parte 2



"a fé pode ser um grande susto, pode significar cair no abismo..."

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6.1.09

momentos inesquecíveis (alice sendo melancólica) parte 8


" I feel like if someone were to touch me, I'd dissolve into molecules. "

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Personagem Jesse, interpretado por Ethan Hawke antes de ser abraçado pela mulher que sempre amou e que não via há uma década no filme/continuação Antes do por do sol (assistam Antes do amanhecer primeiro!). Ah... adoro...


5.1.09


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" Hypocrisy over the word 'terrorism' is not an innocent dispute over semantics; it kills. "

Robert Parry


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E a dor que essa hipocrisia causa é tão imensa que não cabe na mídia, não faz parte da "verdade" vendida a preço de sabão e não garante um futuro para quem é deixado de lado. Isso me cansa imensamente.

Para ler a notícia inteira, clique na citação.



porque a gente precisa ouvir denovo, novamente e mais uma vez...


"O mundo não tem sentido sem o nosso olhar que lhe atribui forma, sem o nosso pensamento que lhe confere alguma ordem. É uma idéia assustadora: vivemos segundo o nosso ponto de vista, com ele sobrevivemos ou naufragamos."

Lya Luft



momentos inesquecíveis (alice sendo melancólica) parte 7


Forrester: In some cultures it's good luck to be wearing something inside-out.
Jamal: And you believe that?
Forester: No, but it's like praying: what do you risk?

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Conversa entre Forrester, interpretado por Sean Connery e Jamal, interpretado por Rob Brown no filme 'Finding Forrester' do Gus Van Sant. Simplesmente tocante.

Aquele ali no canto tem um remorso do tamanho do mundo carregado entre os olhos. As sobrancelhas fartas não escondem bem o jogo, seus dedos não cansados de tamborilar o topo da mesa de metal barata, não reagem a sua falta de respiro. Parece em estado de total infertilidade mental mesmo concentrado. Em que? De certo em nada, ou em seu remorso enfartado que de graça o tira o fôlego - aquele! - que nunca parece retornar ao seu ser. Ele tinha um plano, e esse o enforcou sem que tomasse conhecimento. Ouvia Beatles e John era o seu preferido, gostava da canção Imagine, porque dizia com o peito ceio que era o seu "hino"... Ah, gostava de pintar. Sua ex-mulher ainda tem muitos de seus quadros, todos com motivos hippies e "tie-die" no porão da casa onde moravam, casa herdada pela família dela que os sustentaram por todos os seus anos felizes, aqueles que ele havia esquecido. O remorso recontava os dias. Quanto tempo estaria vivo sem viver pelo o que havia planejado no início? Não sabia. Os dedos continuavam e a pressa para se alcançar qualquer ritmo definhava com a noite que caía. Era de plástico, - pensava - aquele copo era de plástico. Enquanto eu o observava me restava uma dúvida: teria ele a consciência de tamanho remorso?


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Dois passos haviam sido dados, de frente para o seu carro parado na calçada enquanto os últimos flocos de neve caíam sobre seu cabelo. A luz forte que iluminava a rua não vinha da lua. Bang. Gritos sem rosto. Um rapaz com um capuz corria na direção contrária do fluxo, o homem que ouvia Bealtes e pintava quadros enquanto sua ex-mulher vendia camisetas na praça caía duro sobre o capo, em sua mão direita uma carta de resignação do cargo alto que ocupava há mais de dez anos na maior máfia organizada já vista em ação no mundo. Sua consciência fluiria livre novamente, se o destino não fosse tão irônico.